Quando deixar de vacinar é ilegal no Brasil
05:26O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que reúne normas com objetivo de proteger o direito à vida e à saúde de crianças e adolescentes, estabelece que "é obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias".
Ela é obrigatória desde a formulação do Plano Nacional de Imunização (PNI), na década de 1970, que prevê a aplicação de vacinas desde os primeiros dias de vida do bebês nascidos no país.
Para presidente da Comissão de Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-RJ, Silvana Moreira, os pais ou guardiões não levam os filhos para vacinação segundo os cronograma do PNI estão cometendo um "ato ilegal", e caberia às autoridades, ao Ministério Público, por exemplo, levar o caso à Justiça.
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Quanto às demais vacinas que devem ser tomadas até os 29 anos, menos de 66% das crianças foram vacinadas na campanha de vacinação contra a gripe em 2018. Em 2017, a cobertura vacinal contra o sarampo, doença que havia sido erradicada no Brasil em 2016 e voltou a ocorrer este ano com surtos no Norte do país, a dose de reforço não passou dos 71%; a vacina contra a poliomielite, outra doença sob ameaça de ter voltado para o Brasil em 2018, a cobertura nacional foi de 77% no ano passado e pelo menos 312 cidades estão com a cobertura vacinal contra pólio abaixo de 50% este ano.
"É preciso ressaltar para a população que o Programa Nacional de Imunização é considerado um marco na defesa de direitos à saúde e ao desenvolvimento humano saudável, sendo um programa de saúde respeitado e elogiado por organismos internacionais", afirma o presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB-PR, Anderson Rodrigues Ferreira.
A BBC News Brasil ouviu autoridades sobre Direito da Criança e do Adolescente e responde às principais dúvidas sobre o assunto.
O calendário de vacinação infantil brasileiro estabelecido pelo PNI é um dos mais extensos do mundo. Ele prevê que as vacinas já comecem a ser aplicadas após o nascimento, na maternidade - onde o recém-nascido deve receber as vacinas BCG e Hepatite B.
Entre os 2 e 12 meses, é responsabilidade dos pais levar o bebê às unidades básicas de saúde para receber a vacina penta, a pneumocócica 10 valente, a vacina oral rotavírus humano (VORH), a vacina inativada de poliomielite (VIP), a Vacina Oral Poliomielite (VOP), a vacina Meningocócica C, a vacina contra febre amarela e a tríplice viral (sarampo, rubéola, caxumba).
Aos 15 meses, são obrigatórias mais três vacinas: a tetraviral (Sarampo, rubéola, caxumba, varicela), a vacina contra hepatite A e DTP (tríplice bacteriana).
Entre os 10 e 19 anos, são obrigatórias as vacinas dupla adulto (com reforço a cada 10 anos); uma dose de reforço da Meningocócica C; e duas doses da vacina contra o HPV (para meninas, as doses devem ser aplicadas entre os 9 e 14 anos; para meninos, devem ser aplicadas entre os 11 e 14 anos). os 4 anos, os pais deverão levar os filhos para vacinar contra varicela, além de uma dose de reforço da vacina DTP e uma dose de reforço da VOP.
Entre os 10 e 19 anos, são obrigatórias as vacinas dupla adulto (com reforço a cada 10 anos); uma dose de reforço da Meningocócica C; e duas doses da vacina contra o HPV (para meninas, as doses devem ser aplicadas entre os 9 e 14 anos; para meninos, devem ser aplicadas entre os 11 e 14 anos).
"Os pais são os culpados quando colocam seus filhos em situação de vulnerabilidade e sujeitos à negligência. Não vacinar é expor os filhos à essas duas situações", afirma Ferreira. Assim, é considerado responsabilidade dos pais quando estes se recusam a vacinar os filhos - essa recusa pode ter diversos motivos, como crenças pessoais, crenças religiosas, motivos pessoais etc. - ou quando não cumprem o calendário de vacinação por simples esquecimento.
"Os pais que não vacinam, independente do motivo, devem entender que nenhum direito individual pode sobrepor ao direito coletivo. A vacinação é um direito coletivo porque também atinge a sociedade como um todo no sistema de imunização", explica Ferreira. "Desrespeito às vacinas previstas no PNI é, por si só, um ato grave contra a saúde pública", completa.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, a penalidade para a não vacinação obrigatória dos filhos é a cobrança de multa de três a 20 salários mínimos.
Se esses pais deixarem mais uma vez de vacinar os filhos, deverá ser aplicada outra multa no valor do dobro da primeira, o que pode chegar, em valores, a R$ 19 mil.
Descumprir o calendário de vacinação infantil pode resultar na perda da guarda dos filhos?
Segundo Moreira, sim. "Descumprir o calendário de vacinação infantil pode ser entendido como falta de cuidado e a negligência dos responsáveis sobre os menores. Isso pode acarretar na perda do poder familiar."
Ferreira completa afirmando que antes, contudo, as autoridades devem tentar conscientizar os pais e responsáveis sobre a importância da vacinação. "A perda da guarda nesse caso da vacinação é uma decisão mais extrema. Inicialmente, temos que trabalhar e incluir esta família, e não simplesmente retirar a criança do seio familiar", explica o presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB-PR. Assim, antes da perda da guarda, os pais ou responsáveis receberão uma advertência e serão encaminhados a cursos ou programas de orientação.
O que acontece com os pais ou responsáveis se a criança morrer por causa de uma das doenças cobertas pela vacinação obrigatória?
A pena para homicídio culposo é de detençao de um a três anos.
Escolas e creches podem cobrar a carteira de vacinação das crianças?
A presidenta da Comissão de Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-RJ ressalta que as escolas e creches não só podem, como devem fazer a cobrança.
"Essas instituições podem e devem cobrar a carteira, pois devem zelar pela saúde de seus estudantes", afirma Moreira.
Escolas e creches podem negar matrícula caso a carteira de vacinação não esteja em dia?
Segundo Ferreira, não, mas podem agir a favor dessa criança levando o caso às autoridades. "Nesse caso, esses lugares devem informar a situação dessa criança à Rede de Proteção Integral à Criança e ao Adolescente", explica.
Denunciado, o caso seguirá para o Conselho Tutelar e, a depender da situação em que a criança deixou de ser vacinada, os pais ou responsáveis poderão, como explicado acima, sofrer advertência, serem multados em dinheiro ou, em último caso, perderem a guarda da criança.
Além dos pais, o Estado também pode ser responsabilizado pela não vacinação de uma criança?
Moreira explica que sim. "A proteção à saúde da criança está prevista no artigo 227 da Constituição Federal, em que é dever da família, assim como da sociedade e do Estado, assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde e à demais direitos básicos", afirma.
Nesse caso, o Estado pode ser considerado culpado se não garantir o acesso da população às vacinas obrigatórias, não garantir o abastecimento das unidades básicas de saúde ou deixar de notificar as doenças que ocorrem no território e que poderiam ser prevenidas com as vacinas.
Além do esquecimento dos pais sobre a importância de imunizar os filhos ainda na infância contra doenças já esquecidas, como difteria, rubéola, sarampo, paralisia infantil, tuberculose e demais infecções graves comuns no século 20, há os movimentos antivacinação, formado por pessoas que questionam a eficácia e segurança das vacinas.
Mas, segundo pesquisa feita pelo Imperial College London, na Inglaterra, e na National University de Cingapura, esses movimentos são pequenos no Brasil: dos entrevistados brasileiros, apenas 4 a 6% são contrários à vacinação, enquanto que 70% afirmaram confiar na segurança das vacinas.
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